MMXXI.12 - A ESPERA É A PIOR PARTE

 

os sistemas de apoio às artes e à cultura são sempre mecanismos falíveis e sujeitos a falhas, mercê da diversidade de áreas abrangidas pela latitude de conceitos como arte ou cultura. como tal, de uma forma ou de outra, é sempre possível encontrar imperfeições, dependendo do ponto de vista com que se olha para a questão. tal não implica, contudo, que não as apontemos.

no caso do continente português, mais especificamente no sistema de apoio da direcção-geral das artes, os governos dos açores e da república trilharam um longo caminho no sentido de alterar a regulamentação do modelo de apoio, passando a integrar a possibilidade de candidaturas por parte de entidades não sediadas no continente português.

tratava-se de uma injustiça gritante: os agentes culturais sediados no continente podiam candidatar-se aos sistemas de apoio dos açores, competindo com o montante disponível para a cultura, ao passo que os agentes culturais sediados nos açores não se podiam candidatar aos sistemas de apoio da dgartes. a tal velha questão da unidade nacional.

esta alteração à lei permitiu que alguns projectos regionais alavancassem e pudessem finalmente atingir os patamares de desempenho almejados. porquê? porque umas migalhas do montante disponível a nível nacional atribuídas a projectos regionais cifram-se nas dezenas de milhares de euros, para além de serem atribuídos plurianualmente. 

aliás, se há aspecto de cabal importância em qualquer sistema de apoio à cultura e às artes é o da previsibilidade. logo depois da transparência e antes da celeridade. só com uma previsão aproximada dos períodos de candidatura e dos processamentos dos apoios concedidos é que é possível aos agentes culturais cumprir o agendamento e a execução dos projectos submetidos a apreciação dos júris dos sistemas de apoio.

na última década, o governo dos açores operou diversas alterações aos sistemas de apoio da direção regional da cultura, tendo caminhado num sentido de maior transparência, maior tempo de candidatura para a preparação dos documentos, maior celeridade, quer na análise dos projectos apresentados quer no processamento dos pagamentos aos agentes culturais dos açores, e uma maior desburocratização.

assim, os sistemas de apoio foram desenhados de forma a que os agentes culturais apresentassem candidaturas num ano para projectos a serem realizados no ano seguinte, com um prazo de candidatura alargado, sendo que as propostas de despacho deveriam ser conhecidas no final do ano da candidatura, para que os processamentos das primeiras tranches ocorressem no primeiro trimestre do ano de execução dos projectos candidatos.

a título de exemplo, as candidaturas apresentadas até ao final de setembro de 2019 conheceram os seus resultados antes do final desse ano e o processamento dos primeiros apoios decorreu durante o primeiro trimestre de 2020. ao fim de uma longa caminhada, parecia que os prazos tinham encarreirado, finalmente.

em 2020, o prazo de candidaturas ao “sorefil – programa regional de apoio às sociedades recreativas e filarmónicas” e ao “rjaac – regime jurídico de apoio às actividades culturais”, ambos sistemas da direção regional da cultura, decorreu entre 1 de junho e 30 de setembro. os resultados deveriam ter sido conhecidos até ao final do ano de 2020, sendo que os pagamentos deveriam ter acontecido no primeiro trimestre de 2021.

estamos em junho de 2021 e ainda não há fumo branco. sabe-se que houve mudança de governo, sabe-se que o novo governo tomou posse em finais do ano passado, sabe-se também que o actual padre da cultura é inexperiente e, aparentemente, pouco sensível às questões práticas dos agentes culturais, sabe-se isto e muito mais. 

o que não se sabe é porquê.

por que razão ainda não foram publicados os despachos de apoio aos agentes culturais dos açores? por que razão não há uma explicação ou informação aos agentes culturais deste atraso? qual o objectivo da direcção regional da cultura em não fazer dos apoios à cultura sistemas céleres e eficazes?

o que se sabe é que, para os projectos a serem realizados em 2022, o prazo de candidaturas decorre entre 1 de junho e 31 de agosto – 92 dias, portanto, menos 30 do que antes – e decorre numa altura em que os agentes culturais ainda nem conseguiram realizar o que tinham previsto para 2021, quanto prever e candidatar projectos para o ano que vem.

tom petty & the heartbreakers têm uma música chamada “the waiting”, na qual cantam “the waiting is the hardest part/every day you see one more card/you take it on faith, you take it to the heart/the waiting is the hardest part” e é tão só o que me vem à mente quando penso que metade do ano já passou, que, mesmo que os apoios sejam publicados na próxima segunda-feira, ainda faltarão um ou dois meses para o processamento de parte dos pagamentos, que, na melhor das hipóteses, as primeiras tranches serão recebidas pelos agentes em setembro, e que restam apenas 4 meses para o fim do ano.

é como a canção diz: a espera é a pior parte, aguentamo-la com fé. há que ter fé. se calhar, se todos os agentes culturais tiverem fé, o padre da cultura se digne a obsequiar-nos com a sua função de director regional da cultura, cumprindo o que deve ser cumprido.

até lá, esperemos.

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