RAÍZES
a nêveda é uma planta silvestre muito comum nos açores, especialmente aqui na ilha terceira, proveniente da família labiata – que é o mesmo que dizer uma prima afastada das comuns urtigas que enfeitam os nossos muros de pedra e também uma prima em terceiro grau da hortelã que tão deliciosamente condimenta as nossas açordas.
mas a nêveda nem é urtiga nem é hortelã. é ela própria, indiferente às possíveis relações de proximidade que o mapeamento genético possa estabelecer entre os seus próprios blocos de adenina e os blocos de citosina da hortelã ou da guanina da urtiga. a nêveda é única. por vezes néveda, muito comum, mas nunca urtiga ou hortelã. apesar da frescura das suas infusões e das aguardentes que dela se fazem.
entretanto, o glacial foi um suplemento do jornal a união, da cidade de angra do heroísmo, publicado entre os anos de 1967 e 1973, e que teve a coordenação de carlos faria. intitulava-se “página de literatura e pensamento” e o seu nome provocava, ou pretendia inspirar, um “arrepio enorme, glacial!” nas mentes e pensamentos literários dos seus leitores. sabendo de antemão que tal intenção era por natureza um “atrevimento” que teria de ser pago e bem pago, o glacial veio a público a 15 de julho de 1967.
no seu segundo número, publicado a 11 de outubro de 1967, num pequeno texto do seu coordenador, o glacial assume-se como uma página de artes e letras, à qual tudo interessa e à qual todos os assuntos lhe são próprios. numa espécie de eco que tem tendência a repetir-se até ao início dos anos 90, senão mesmo até aos nossos dias, continua: “Uma página de artes e letras não pode ser um cantinho de saudade e regionalismo, nem pode viver do balofo compadrio de compadres e comadres! (...) Não pode ser um cemitério de ‘vivos’ ou um clarim a anunciar os mortos: Tem de ser a Vida, a arte, a presença responsável e a realidade!”.
para além do saudosismo inerente à leitura de palavras tão apaixonadas, especialmente a estes anos de distância, há também a inevitável sensação de se estar perante declarações de uma luta inglória. quantas vezes não se ouviu esta de se remar contra a saudade e contra o regionalismo, projectando a verdadeira universalidade.
nestas palavras, há como que uma convicta esperança revolucionária quando escrevem que “Uma página de artes e letras é um campo de combate e pensamento e o local onde pode e deve ‘soar a hora’!”. esta é a assunção de uma verdadeira prática literária no quotidiano, como motor de desenvolvimento e de pensamento da sociedade. há nestas palavras uma esperança de verdade. uma verdadeira esperança – daquelas esperanças revolucionárias que alimentam os ingénuos e orientam os idealistas, mantendo ao mesmo tempo esperançosos os optimistas.
nos dias de hoje não há palavras que provoquem arrepios – glaciais ou nem tanto. daí a escolha da nêveda para título desta crónica – uma crónica que pretende, por um lado: trazer aos nossos dias peças literárias que compuseram o suplemento glacial na ilha terceira, berço de publicação de então jovens autores que mais tarde se haveriam de tornar status quo na literatura dos açores, berço de divulgação e promoção das artes e da palavra escrita, que tanto importa aos nossos dias; e por um outro lado, e de uma forma assumidamente caótica e contemporânea considerar aproximações, leituras e revisitações de textos que apesar de públicos são pouco conhecidos.
11.12.2016
rogério sousa
para além do saudosismo inerente à leitura de palavras tão apaixonadas, especialmente a estes anos de distância, há também a inevitável sensação de se estar perante declarações de uma luta inglória. quantas vezes não se ouviu esta de se remar contra a saudade e contra o regionalismo, projectando a verdadeira universalidade.
nestas palavras, há como que uma convicta esperança revolucionária quando escrevem que “Uma página de artes e letras é um campo de combate e pensamento e o local onde pode e deve ‘soar a hora’!”. esta é a assunção de uma verdadeira prática literária no quotidiano, como motor de desenvolvimento e de pensamento da sociedade. há nestas palavras uma esperança de verdade. uma verdadeira esperança – daquelas esperanças revolucionárias que alimentam os ingénuos e orientam os idealistas, mantendo ao mesmo tempo esperançosos os optimistas.
nos dias de hoje não há palavras que provoquem arrepios – glaciais ou nem tanto. daí a escolha da nêveda para título desta crónica – uma crónica que pretende, por um lado: trazer aos nossos dias peças literárias que compuseram o suplemento glacial na ilha terceira, berço de publicação de então jovens autores que mais tarde se haveriam de tornar status quo na literatura dos açores, berço de divulgação e promoção das artes e da palavra escrita, que tanto importa aos nossos dias; e por um outro lado, e de uma forma assumidamente caótica e contemporânea considerar aproximações, leituras e revisitações de textos que apesar de públicos são pouco conhecidos.
11.12.2016
rogério sousa
Comentários
Enviar um comentário